quarta-feira, 31 de agosto de 2011

HOMENAGEM: O APANHADOR DE DESPERCÍCIOS- MANOEL DE BARROS (BRASIL)








Foto: Pássaros


O APANHADOR DE DESPERDÍCIOS

MANOEL DE BARROS (BRASIL)


Uso a palavra para compor meus silêncios
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
as que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimporantes.
Prezo instos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos misseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas
Queria que a minha voz tivesse um formato de danto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.


( Manoel de Barros. Memória inventadas; a infância. São Paulo. Planeta do Brasil, 2003)

Nenhum comentário:

Postar um comentário