domingo, 30 de dezembro de 2012

POESIA: ARRANJOS FLORAIS - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES




ARRANJOS FLORAIS

   
                               VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES



I

alguns capítulos tão nosso,
nesse jardim
em que as mulheres semeiam
açucenas,
violetas,
peônias,
amapolas,
petúnias,
papolas
e entre sementes
inúmeras pétalas
perfumam as mãos que
cálidas cultivam
o amor
quando azaléas
e amarílis
fincam no solo
a Esperança flor,
assim escrevo o enleio... Na possibilidade de...


II

um livro aberto a celebrar suas páginas,
tão prenhe de prímulas,
vazadas na luz de teu sorriso de artesã do tempo,
surge ávida: linguagem


III

... sabemos que no invisível, escrito está


IV


amor & vida & todos os sonhos como folha acariciando o rebento


V

e no raio da circunferência desses arranjos florais,
das rosas,
jamais esqueças


VI


só por que comemos da romã as sementes,
não significa
que o brote não vivifique
nem que a água translúcida
impregne as pedras e brote Liberdade, com afinco
do querer

VII

- Saberias, de fato, o que a vida oferta-te nesse instante preciso?






VII

- Saberias, de fato, o que a vida oferta-te, nesse instante preciso?





domingo, 23 de dezembro de 2012

POESIA: COM VOCÊ - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES

Foto: Amoras.




COM VOCÊ


                    Vanda Lúcia da Costa Salles



           Minha boca saliva amor
                 mora
                    amor
                         amora

          Minh'alma cativa aroma
                   flor
                     aro
                         de amor
                             

          Minha vida na lida: fervor
                       amoras
                         amoras
                            amoras
                     humshumshmshums  
                     
( porque ninguém é de ferro!)
                     
           

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

CRÔNICA: DENTRO DE NÓS - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES

Foto: Maria Amaral Ferreira ( Maria Salles), por Vanda Lúcia da Costa Salles (poeta Vanda Salles)

DENTRO DE NÓS

                              Vanda Lúcia da Costa Salles


     Em momentos que a mente acaricia, sei que vives, com esse ar de Dama Antiga e dissimulada porque
sabes que a saudade brota gerânios, tulipas e hortelãs. Como grapete, nomeada era e os netos vinham saber dos causos e namoricos de adolescentes. E ficávamos sorrisos largos, a retirar os cabinhos das pimentas malaguetas ou a formar, peça a peça, a beleza de um fuxico.
     De certo que a dúvida nunca adentrava o afã do peito amante, dançando um samba ou um cateretê. Então, dizias, em tardes de veranico, "a maresia entorna o caldo do pirão de carapeba, moreno, prepara a lenha que o fogo já nos convida". E toda faceira, alisava os lençóis.
     Um dois, três, quatro, cinco, seis filhos seus e mais três de quebra no angu do tacho criados com tapioca, violão e rede. " Neném que o diga, Josias nada sabe do clarão da Lua quando a noite brilhava encanto. Vanda, tão bom seria se tivéssemos um tapete voador, não?" Imaginar nem era preciso, sabíamos que do sonho era a vantagem do guia. Seguíamos pegadas.
     Pintora fosse,  falou um dia, chuva caindo fininha como agulha perdida na cegueira do olhar, " eu pintava a flor, delicada flor, e enfeitava a casa de Seu João Aleijadinho. O pobre, mal consegue respirar, mas também uma solidão tão torta, que nem cal as paredes aceitam. Cotiado, diz caminhar nas horas." Ouvido atento, dentro de nós, a admiração se expandia como pé de samambaia ou cortadeira chorona. Ah!  Senhora de toda nossa vida e matriz de mim, como sufocar a ausência que deixaste nessa casa com portão verde floresta e uma biblioteca comunitária num desejo todo próprio do projeto firmar?
     Num cavalinho branco que penso ser o unicórnio azul de teus sonhos de menina ( o qual, contaste oras a fio, enovelando as nossas cabeças fantasiadas de colombinas, em uma noite de Carnaval passado em Balneário de São Pedro D'aldeia), partistes, como quem parte desejando boa-noite e no dia seguinte viesse convidativa para um banho de mar, nas Dunas ou no Farol.
     Às vezes, ao ler sobre o Egito Antigo ou  O Alienista, de Machado de Assis, creio vê-la ao meu lado, tão dentro de nós, em sorriso de coqueteria, "ainda serás, uma grande, mais grande professora e eu, apenas a mãe".
     Chamava-se Maria Amaral Ferreira, neta do Capitão Costa, filha de Olívia da Costa amara, e amava poesia.









domingo, 21 de outubro de 2012

POESIA: UM BEIJO SÓ - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES







UM BEIJO SÓ


                         Vanda Lúcia da Costa Salles





Lindos e entristecidos estavam
como se a chaga não recebesse o bálsamo
como se o sorriso não alcançasse a luz
como se a vida não soubesse
que um beijo só bastaria
 para que o sonho
    tangesse o bandolim










sábado, 6 de outubro de 2012

CRÔNICA: A MULHER QUE ESTUDAVA A FUNÇÃO DE MORSE AO REDOR DA ORIGEM - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES





Foto: pássaros





A MULHER QUE ESTUDAVA A FUNÇÃO DE MORSE AO REDOR DA ORIGEM


                                                    Vanda Lúcia da Costa Salles




      Ela sabia que usava números.  Ao longo de sua vida, disseram a ela que a suavidade das coisas nem sempre estabeleceriam o valor dos acontecimentos e muito menos o prolongamento de seus avessos. Os avessos, para ela, sempre foram números impessoais na teoria das singularidades porque o que dominava mesmo era a variante local das interpessoalidades.
      Naquele dia estranhável, decidira que em sala de aula ousaria aplicar e classificar as patologias decorrentes da ausência de afetividade de uma inversa local ao redor de um determinado ponto do domínio de uma função diferenciável a uma emoção qualquer. Nunca saberia da possibilidade... Ah!  se não fosse a chuva torrente que caía.
      Ao descer do ônibus  na esquina da escola ( ela andava de ônibus porque seu dinheiro de professora não cabia no orçamento de um carro particular) percebeu duas enormes poças d'água enlameadoras e ameaçadoras. Dito e feito na composição de sua intuição, fora banhada cabeça aos pés pelas águas impuras da dita poça. quando um outro ônibus acelerado e acelerando propositalmente, o motorista sorrira insano pelo prazer de vê-la, ali, estupidamente gelada. Mal pensou, esqueceu completamente as aulas que daria, além  da construção neuroestética pelo prazer em que estudava a função de Morse ao redor da origem.
      No mesmo passo que vinha, voltou. Subiu na primeira condução que a levasse para o aconchego do lar. Sentia uma emoção nervosa e dolorida no desconforto da roupa molhada e uma indignação ou melhor, uma impotência diante da lembrança do sorriso perverso do trabalhador daquela viação 04.
      Alguém que a observara da janela, quebrando o silêncio dos passageiros, indagou-lhe curioso:
      - Então Senhora, seus alunos ficarão sem aulas hoje?
      - O Senhor viu o que aconteceu? Impossível, não?!
      Simultâneo ao diálogo, adentra apressada nesse outro ônibus uma Senhora loura, encharcada da chuva que caía, torrencialmente, parecendo anunciar um dilúvio. E pede ao motorista uma carona porque não tinha condições de pagar a passagem para chegar até a cidade do Alcântara, pois se faltasse não conseguiria o emprego combinado, dizia ela, que o dia anterior havia tido febre de 39 graus. O motorista achando que era caô, negou, é claro. Ela insistiu, o trabalhador negou, explicando que se lhe deixasse atravessar a roleta, ele é quem teria que pagar a passagem no valor de dois e sessenta centavos. Pensei, que cacete é a vida de um trabalhador com salário mínimo, chegar no dia 20 do mês e não ter dois e sessenta centavos para uma passagem, que país é esse? O meu, é claro. Diante do silêncio profundo produzido pela Senhora que ajoelhada, pedia, implorava, minha voz rouca e forte se fez ouvir: motorista deixe-a passar, eu contribuo com dois e quarenta centavos, é tudo o que tenho na bolsa. Quem pode inteirar quarenta centavos?
       Uma Senhora Negra puxou uma pequenina bolsa e ofertou  duas pratinhas de vinte centavos. Entre os 18 passageiros, somente ela sabia de empatia à causa da dignidade de uma trabalhadora em um dia nefasto, porque " isso também já aconteceu comigo". E a  nova passageira, agradecida e agradecendo com seus olhos azuis marejado de lágrimas, explicava a nós duas:
       - Pedi tanto a Deus enquanto caminhava e decidi pela carona nesse ônibus, que enviasse um anjo em meu auxílio. Veja, Deus atendeu as minhas preces. Em vez de um, enviou-me dois anjos, agora sei que ficarei no emprego que vou ver para mim.
       Dentro daquela lotação, vinte e uma pessoas aprenderiam, cada uma com a sua percepção, a importância invertível, ao descrever o dia, via mudança suave de coordenadas.
     
     
 
  

domingo, 30 de setembro de 2012

POESIA: NO OLHAR DA JACUTINGA - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)





                         NO OLHAR DA  JACUTINGA


                                                     Por: Vanda Lúcia da Costa Salles (Brasil)




           
o sonho desdobras em sua garganta azul
                             delicadamente
                                da palavra preservada, o amor quis
                                                     somente como semente
                                                                  o toque harmonioso das línguas


                no olhar da jacutinga
                          um outro olhar que vê
                                       o que se quer dizer:
                                                     não a extinção!




e se a vida desse forma, seríamos uma poesia?




a ti, oferecida está minha linda acatinga
               cravejada de itapirangas
                    com provocantes
                             ubatubas
                                 circundadas de itatinga
nesse chão de ibiúna onde corre alta
                     maracanatuba
                       pacatuba
                          piratuba
                             e até
                             um quê de leve que me causa, e piando firme
                                                                                 na matula trago afagos


sei que sou apenas um selvagem
                um joão-ninguém
                     um sonhador
                           que apenas conhece cada folha da floresta em que vive
                                                            e medra a flor, tão livre flor


como a graúna que pia forte
                       e destemida voa
                                 num galope só


e se nada sei dessa civilização
                         que renega a nossa condição
                                                  no olhar da jacutinga
                                                                          o colorido da mata, e nesse olhar
                                                                                                   
         


um quê de leve que me causa
                                 


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

DA POÉTICA DE ROSANE SALLES E A QUALIDADE PSÍQUICA



Foto:  Rosane Salles Silva Souza, por Vanda Lúcia da Costa 


      DA POÉTICA DE ROSANE SALLES E A QUALIDADE PSÍQUICA ATRAVÉS DE BONECOS DE PANOS

       " É emocionante ver como as crianças desenvolvem maior concentração e motivação para criarem através de seus bonecos de panos, brincadeiras, histórias que compartilham com toda a sua criatividade e alegria. Assim as pensei e criei."




BONECA DE PANO   I  - A  QUE CONTA HISTÓRIAS




BONECO DE PANO II   -   PARA A CRIANÇA ELIAS




BONECO DE PANO III   - PARA A CRIANÇA ISAIAS   

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

POESIA: SENÃO QUANDO - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)

Foto: Maçãs


                                    SENÃO QUANDO


                                              Vanda Lúcia da Costa Salles (Brasil)



um ato bobo
este
de pensar
na vida
e que
a vida
de súbito
floresça
o que há de imprimir
e forme
a fruta
que ague
a boca faminta
e este gosto
de pássaro ser


( Alcântara-São Gonçalo, 03 de setembro de 2012)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

DIVERSIDADES E LOUCURAS EM OBRAS DE ARTE II - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)



Foto: POBRES Á BEIRA DO MAR, de PICASSO




                     PABLO PICASSO -O AZUL COMO EXPRESSÃO DE  RESILIÊNCIA E VIDA


                     Ao nascer e escapar da morte, recebe o nome de:  Pablo Diego Jose Francisco de Paula Juan Nepomuceno Crispin Crispiniano de la Santisima Trinidad Ruiz Blasco Picasso y Lopez, o pintor PABLO PICASSO será um resiliente por natureza

                     Em seus 21 anos(1901),  chocado com o suicídio do amigo e pintor CASAGEMAS, em Paris, reelabora-se e dá início a melancólica FASE AZUL e enche as suas telas de dor, nas imagens de cegos e estropiados, isto é,  coloca os pobres como reveladores de um mundo até então nunca visto. Daí constrói: A VIDA, POBRES À BEIRA DO MAR e O ACROBATA COM A BOLA.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

POESIA: C'EST LA MÊME CHOSE - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRÉSIL)









Foto: Praia de Icaraí (por celular)-Vanda Salles




C'EST LA MÊME CHOSE



                    Pour: Vanda Lúcia da Costa Salles (Brésil)
I

qui a dit?
l'amour qui se passe...


II

Elle n'est jamais là!
Pourquoi?
Pourquoi?
Ce matin la nostalgie
Diz-moi
kiss me la poésie


III


entre les chats et les oiseaux
un ciel bleu
une huile sur toile
C'est la même chose pour toujours?
Une personne se promène sur la plage
dans mon imagination...


IV

L'amour ne se passe pas seulement




quarta-feira, 1 de agosto de 2012

TÁBUAS PINTADAS - QUEM É ROSIMARY SANTOS ?



ROSIMARY SANTOS

Artesã e  artista plástica gonçalense (RJ).Nascida em  1970. Possui excelentes trabalhos, tais como: tábuas em madeira, luminárias em pvc e  óleo s/telas. Ama o que faz: espalhar a alegria e o prazer com suas criações.







nº 1 - Mulher regando as flores


quinta-feira, 5 de julho de 2012

POESIA: LEITURA - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES

Foto: Real Gabinete Português de Leitura







LEITURA


      VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES




não estaria propensa a flor
se
a leitura -
parte essencial no humano de mim -,
não fecundasse o instante






domingo, 17 de junho de 2012

POESIA: CÂNTICO DA MUSA - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)



Foto: Café Literário ( Eventos e Comércio de Artes) da autora





CÂNTICO DA MUSA

          Por: Vanda Lúcia da Costa Salles (Brasil)


Ainda vivo e canto,
encanto,
meu canto é, na verdade,
o que em mim aos pássaros é exercício de asas.
Em madrugadas frias
ou noites desvairadas, apenas
canto esse meu canto profícuo,
a embalar tantas vidas,
a enamorar-se das dádivas
para presentear-lhes em gorjeios
na voz/palavras da
fonte do Amor
A despertar-lhe o caminho,
no gosto,
do seu gosto,
a única e inequívoca verdade.
Assim,
ainda vivo e canto,
encanto



sexta-feira, 11 de maio de 2012

POESIA: ESTA É A FELICIDADE... - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES

Foto: Kafka


ESTA  É A FELICIDADE...



                  VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES ( RIO DE JANEIRO -BRASIL)



Esta é a felicidade... abrir as páginas de teus sonhos e tocar
levemente,
gozosa escrita: alento d'alma,
que espia prosa & verso
como o caminho descrito pelo esguicho do jorro faceiro, da centelha divina
nas águas de um chafariz.


Esta é a felicidade... o enamoramento dessa face, tão tua
No aguçado olhar, pássaro em fogo, linguagem sedenta
esclarecendo toda
a lucidez
 invasora lucidez
ao pequeno ato de ser, apenas
a poeira da estrada.


Esta é a felicidade... ao fechar do livro, saber
da obra, o que resta: imaginação em processo,
não somente
um terno cinza numa manhã tão cinza de sorrisos.
Saber que mesmo no silêncio das horas, estamos
aqui,
um no outro.



Esta é a felicidade... ler a possibilidade que deixou-me em face!



terça-feira, 1 de maio de 2012

POESIA: ESQUISITICES- VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES



ESQUISITICES


                       VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES
                   I
  espelho d'água contempla sua face, os vértices
  no espaço dobram as notas, corro ofegante
  para que o tempo dê tempo, quando
  as pautas passeiam músicas, e encantam o
  pontilhar esperançosos dos signos, como
  essas pétalas unidas em flor

                  II

um caminho se estende, pernas
através da chuva atravessam pontes, e este
friozinho na barriga organiza o mote
destas esquisitices, broto
como um broto que acontece primaveril
em jardins de coração afável

                 III


o gato que parece chateado, enrosca
solto e o denomino poeta, um sorriso escapa
e a força da realidade se rende,
(na consciência da limitação),
à palavra mágica que doma, este
físico diálogo

quarta-feira, 25 de abril de 2012

POESIA: PÁSSARO DOURADO- VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES



PÁSSARO DOURADO

     Por : Vanda Lúcia da Costa Salles


     A todos os amigos ( e aos que virão)


No instante em que lemos, amor
As asas aplumam-se para o voo livre,
De pássaro dourado que és
Assim, a vida passeia em nossas entranhas, sem agonia.


É essa dourada cotovia passeia destemida, faceira


Paixão de sempre: do dia em que contavas nos dedos
O quanto sabias de números e segredos, ou
Rias alegremente, com vontade


Ah!  E a primeira poesia? Como gargalhavas, no instante perspicaz
Cantando a amizade e esse nosso amor pelas palavras
Amenizando a vida, o tempo e a rota
Sonhando musgos, orquídeas e compassos
Ou agasalhando o projeto com dedos firmes e zelosos...


E aqui, estamos nós, na fugacidade do tempo
Um pássaro dourado, cantando


Sua liberdade de voo, encanto
Em corpo humano, amigo do sonho de ser
Isso : a dobra no avesso do avesso, Ave!
 

sexta-feira, 6 de abril de 2012

POESIA: UM GRÃO DE AREIA - VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)





UM GRÃO DE AREIA



VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)



alimenta-se do grito
espelhado,
enigmático,
agônico,
estriônico,
que seja onda
esse som que resta ao grão,
em sua metamorfose


de areia
esculpido por vagas
e ventos e mais que seja
na onda
de marés,
gestos serpenteados
no gozo da flor
aberta a lírios e colibris


a tempestade em tormentas
nem sempre alcança o sonhador,
e se edifica
ou assim fica,
resta apenas,
um grão de areia... Nas mãos o afago,
e nos olhos que vê,
além da praia
(o arrebento de espumas pulverizando)
os desenganos
rochedos de poesias... E na língua, o acre-doce sabor!

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

CONTO: O CURIBOCA E A CUMBUCA- VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)



Foto: Vanda Lúcia da Costa Salles




O CURIBOCA E A CUMBUCA






O caraxué cantou no laranjal espremido por entre as folhas esconderijos. O curiboca foge de si mesmo. Colocara a mão em cumbuca e não sabia como sair.
A lenda narra que amarrou a liana aos pés e pulou o abismo. Evolou-se. No litigo bateu e o élan do corpo evaporou-se. Vergonha foi da insídia cometida. Deixou cair o escudo tribal.
Todos sabiam na tribo que seria assim. Estava escrito. Sua conduta exorbitante, sempre fora exercício de exibição e desgosto para a pequena indígena que o criara com profundo e infinito amor.
O escudo ficara entrincheirado entre as pedras. No alto, da Serra Barriga. Um tempo viria em que o Outro descobriria o segredo. Se segredo houvesse. Mas vovó Cambinda, calma esperava o curiboca e o seu amigo albino, confiante no sorriso do neto que a levaria aos parentes mais próximos, além mar. Viveria na América, sim senhor!
Estúpido preparara a armadilha para a anciã que sorria, aguardando o presente anunciado. O que ela não sabia era que ele a vendera ao branco albino, que se aproximava, remando lento, em sua velha canoa.

domingo, 1 de janeiro de 2012

CONTO: MINHA ESPERANÇA- DAVID RIBEIRO (BRASIL)










DAVID PRADO RIBEIRO(BRASIL)



MINHA ESPERANÇA


Meu nome é Carlos Duarte, médico cirurgião e ortopedista graduado em 2007, pela Universidade de Medicina do Rio de Janeiro, embora tenha muitos anos de carreira, me surpreendi no ano de 2010, quando numa noite chuvosa, passando rapidamente de carro por um atalho nas ruelas de Santo Amaro, avistei um saco azul de mercado com um durex enrolado e apenas alguma coisa se mexendo dentro dele. Aproximei-me e com receio abri o saco e por incrível que pareça era uma criança com má formação em seus dois membros inferiores. Apesar do isolamento, havia um casebre ao longe, com a luz acesa e a porta aberta, sem nem pensar corri até a porta e vi um casal de senhores, sentados, assistindo à novela. E então exclamei:
- Me ajudem a salvar esta criança!
Sem entender muito bem, responderam:
- Sim, nós o ajudamos.
Então levamos a criança e a secamos, ela ainda possuía o cordão umbilical. Fiz os primeiros socorros e a levei às pressas para o hospital em que trabalhava. Lá chegando, todos os médicos se comoveram com a história da criança e a colocaram fora de perigo. Demos a ela o nome de Esperança.
Mesmo sendo recém-nascida, Esperança estava esquecida no hospital. Nenhum casal se interessava em adotá-la e eu já estava ficando muito triste com a situação. Então decidi fazer um teste, criei uma mini prótese para imitar suas pernas e coloquei um lençol até sua cintura. Todos os casais que foram ao hospital naquele dia se interessaram por Esperança.
No dia seguinte retirei as mini próteses e o lençol, e convidei os casais para uma segunda visita e todos os casais desistiram da adoção. Fui para casa indignado, pensando como é possível haver pessoas tão preconceituosas em nosso cotidiano. Daí, perguntei a mim mesmo em alta voz:
- Será que somente eu consigo ver a essência no olhar de Esperança e não a ausência de suas pernas? E tendo ouvido isso minha esposa respondeu-me que “ ela não podendo dar-me um filho, Deus colocou essa criança em nosso caminho. Portanto, deveríamos adotá-la!” – E eu muito feliz respondi-lhe:
- É isso mesmo, amanhã irei entrar com o pedido de adoção.

Chegando ao hospital, fui ao berçário e levei um enorme susto. Esperança não estava lá, então, perguntei à primeira enfermeira que avistei:
- Onde está Esperança? - E ela respondeu-me:
- Doutor, ela passou mal à noite e foi levada ao CTI!
Sem noção nenhuma do que estava acontecendo, corri em direção à porta do CTI, ali, avistei Esperança na cama, já bem melhor, quando me avistou, sorriu e naquele momento eu tive a certeza de que ela me queria como pai.
Depois de meses resolvendo as burocracias da adoção, ela veio para casa, Sofia, minha esposa, era só felicidade. Esse foi um dos momentos mais lindos e felizes das nossas vidas.
Passado algum tempo tendo Esperança 12 anos, as dificuldades só aumentavam e o preconceito também, no ônibus, na rua, no shopping, em restaurantes, sempre havia alguma manifestação preconceituosa e o conjunto desses fatores fez com que Esperança tentasse suicídio. Felizmente ela se recuperou, após ser atendida às pressas.
Após sair de risco de vida, fui visitá-la e quando entrei no quarto e avistei seu rosto, ela sorriu para mim e ao mesmo tempo lembrei-me daquele olhar de menininha, a mesma, que era exemplo de superação em 2010, naquele momento precisava do meu conselho de pai. Então disse-lhe:
- Filha, não se preocupe com o que as pessoas pensam de você, porque você não é pior que elas e tem que saber disso. Desde o primeiro dia de vida és uma sobrevivente, hoje tenta acabar com sua vida? – Com a cabeça baixa ela respondeu:
- Pai, me desculpe por tudo, quero que saiba que sou muito grata pelo que fez por mim!
De lá para cá, Esperança foi muito feliz, pois entendeu que a essência dela estava em seu coração e não, nas pernas que lhe faltavam. Hoje, passado oito anos, estamos muito felizes e vivendo muito bem. Ah! Já ia me esquecendo, tenho que ir, pois estou atrasado para um casamento. O casamento da minha filha: ESPERANÇA!