sábado, 12 de fevereiro de 2011

ARTETERAPIA: GENTILEZA É 'AMORRR' - SOBRE A OBRA DE JOZZÉ AGRADECIDO - POR VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES (BRASIL)




Foto: GENTILEZA E OBRA (RJ)





CAPÍTULO 4- GENTILEZA É ' AMORRR': SOBRE A OBRA DE JOZZÉ AGRADECIDO



Qual a razão por que não compreendeis a minha linguagem? É porque sois
incapazes de ouvir a minha palavra.

(JOÃO, 8:43 )



Allienus, em latim, significa "o outro" (a sociedade). Está alienado, pode-se perder a sensibilidade de intuir, sentir e refletir o fenômeno da vida e do seu momento histórico: essa a grande aventura humana.
Viver é uma dádiva, amar é a ação que pode ser aprendida, compartilhada, cultivada no interior do público e do privado. Bastando pelo desejo amoroso, dotado da atenção e intenção, objetivar essa arte maior.
Amor é o belo, conceito burguês romantizado. Já " Amorrr" é a própria arte. É toda sabedoria de que é capaz o espírito em perfeita comunhão com o Cosmo. É o mito original cuja função divina restaura o equilíbrio perdido. É a religiosidade inerente do/no ser. "Amorrr", portanto é a estética que revolucionará o social. E revolucionará o mundo.
Em seu discuro " ex-cêntrico" (voltado para que a massa se perc eba povo0, Jozzé Agradecido - o Gentileza- pregava a arte como liberdade transgressora, e não o belo. A beleza em suas múltiplas formas; poesia revelada.

(...), porque todos pensaram sempre no belo, que é conceito, e não na arte,
que é fenômeno, coisa real, objetiva, e que não só existe sob uma multipli
cidade de formas como é, em cada momento, uma e múltipla. (MONTEIRO,1961,
P.20)


Marcando uma singular diferença, busca fazer do seu corpo e alma o foco e atenção do povo. Busca, através da linguagem da imaginação, evidenciar a construção de sua obra de arte; poesia no concreto. Ensina que a arte, enquanto linguagem, pode facilitar a aprendizagem na conscientização de formação de seres poéticos, o que assimilou que "compreender profundamente a arte é uma atitude de humildade e de amor" (op. cit,. 1961, p.23).
Parodiando o modelo, Gentileza recria a via-crucis. Preocupa-se com o efeito que é o estranhamento de toda a sua fala. O leitor/fluidor irá ao modelo, mas já assumindo uma postura crítica. na repetição, a informação: um home do povo que se faz divino, um anti-herói apontando o hiato na História, o automatismo dos corpos na paralisação social (obstado por um período longo de ditadura no país). E a ditadura estabelecida, por comodismo e condicionamento, na prática cotidiana.
No mito do profeta, aquele " uma fala,que é mensagem"(BARTHES, 1993, p.131), Gentileza - o pedagogo das massas - em sua poética do espaço denuncia a crise das relações nas relações insignificativas. Primando por uma revisão deos valores da cultura espiritual e material voltada mais para uma radical mudança da realidade cotidiana. Em seu nonsense busca o sentido para a padronização humana, poetizando a ternura gera o processo do auto-conhecimento para a significação humana: colocação da arte na vida. Recolocando-a no seu espaço de direito: no imaginário popular. Num gesto de carícia, um toque dialetizador da luta entre Liberdade X Opressão. Onde se situaria a loucura, quando sabe-se que " amar o próximo não é mais idealismo "místico" de alguns. Ou aprendemos a nos acariciar, ou liquidaremos com nossa espécie" (GAIARSA, apud SHINYASHIKI, 1988, p.11). Seu " Amorrr" - linguagem do inconsciente - verbera e " a linguagem passa a ser vista como entidade histórica, instrumento de intercomunicação social e de expressão cultural" ( MARQUES, 1995, p.35). Reivindica, assim, a originalidade nacional pela linguagem afetiva, humanizada como objeto privilegiado de prazer e saber.
Diz o pregador-poeta: " Não sou obrigado a nada. Ninguém é obrigado a nada. Só agradecido." E reiventa a palavra na triplicação das formas, fundamenta uma ética em sua linguagem divina e desvela o ideológico a arquitetar a reestruturação social através da força de sua cantábile. " Porém, a grandeza das obras de arte consiste unicamente em revlar o que a ideologia oculta. Queiram ou não, sua consecução, seu êxito, supera a falsa consciência." ( ADORNO,apud CASTRO, 1983, p.27).
E o que a ideologia oculta? a dificuldade da humanidade, impedida que está, pela miséria generalizada, de criar um modelo de sabedoria? Na negação pela "parole" que se quer democratizada do modo de ser burguês? Ou da ausência da emoção que funda uma causa: o corpo social fragmentado? O "Amorrr", aqui, como no Banquete de Platão, aparece como criador, cujo poder é incomensurável e não se limita a criar; todavia torna àqueles a quem toca capazes de criar também. " Amorrr" é a cura.



( In: DIVERSIDADES E LOUCURAS EM OBRAS DE ARTE: UM ESTUDO EM ARTETERAPIA, 2002,por VANDA LÚCIA DA COSTA SALLES)

ISBN 85-86854-99-9
9788586854996

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